Assim como poderíamos afirmar, numa espécie de sinestesia geográfica, que Salvador recende a dendê e coentro, não seria exagero afirmar que Kyoto exala aromas de pimenta sancho e yuzu – este último, especialmente no outono. Com suas notas cítricas muito peculiares, a fruta está por todos os lugares. Seja dando caráter a prosaicos dobin mushis (os caldos feitos com frutos do mar, cogumelos etc.) servidos nos mais singelos e não-turísticos izakayas, seja fazendo parte dos longos menus-degustação servidos nos estabelecimentos de kaiseki. E é muito instigante se deparar com a fruta da entrada à sobremesa – ainda que, muito aqui entre nós, também possa se tornar cansativo.
A fotografia à esquerda foi tirada no mês passado, durante um jantar no Kikunoi, um dos restaurantes do chef Yoshihiro Murata, espécie de lenda-viva da gastronomia do Japão. Uma refeição demorada, solene, mas jamais carrancuda.
Do que se trata? De uma entrada batizada pelo chef com o auto-explicativo nome de yuzu tofu, yuzu miso, yuzu brunoise. Espécie de sucinto ensaio sobre a fruta e sua aplicação à mesa, este é o tipo de criação que bagunça nossas certezas sobre fronteiras entre doce e salgado, sobre o uso de texturas. Que nos faz repensar os jeitos de abrir (ou de fechar) um longo repasto. Que por ser tão simples, tão fresca, tão elegante, fica difícil de esquecer. E olha que, depois desta sinfonia de yuzu, seguiram-se pelo menos uma dúzia de pratos…
segunda-feira, 6 de dezembro de 2010
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